A professora Dorothea Nowak chegou em Ijuí no dia 14 de janeiro de 1967. Batizada aos 18 anos, havia participado, com o pai e a família, na resistência ativa contra o regime nazista, e depois contra o comunismo na Alemanha Oriental. Durante a Juventude, ela e sua irmã conseguiram migrar para a Alemanha Ocidental, onde estudaram Teologia e Psicologia. Quando Dorothea já se preparava para o doutorado e para assumir uma cadeira docente na Universidade de Hamburgo, recebeu a proposta inesperada para vir ao Brasil. Sem saber a razão, aceitou o desafio e veio experimentar o choque cultural de trocar um centro acadêmico importante na Alemanha pela organização de uma modesta escola do interior do Rio Grande do Sul.

A professora Dorothea Nowak foi a segunda diretora do Instituto Bíblico, assumindo oficialmente o posto nos anos de 1968 e 1969.

RELATO ESCRITO POR DOROTHEA NOWAK

COMO A OBRA COMEÇOU…¹

Em fins de dezembro de 1966 eu subi num navio de carga – junto com 12 passageiros e 30 tripulantes – meus alunos cantaram um hino de despedida –, uma sirene tocou e o cargueiro Cap San Augustin zarpou em direção ao Brasil.

A maior alegria na minha chegada em Ijuí foi o reencontro com Mimi e Ditmar Junge. Eu os conhecia de trabalhos que realizamos juntos na Alemanha, e agora tinha o privilégio de morar com eles em sua casa tão alegre. Sem a ajuda deles no início eu teria tido muitos problemas na adaptação, pois tivemos que nos arranjar com situações as mais precárias. Foi uma boa ideia a de começar um Instituto para a formação de futuros pastores. A época escolhida foi a certa, mas faltava o dinheiro para a edificação de um Seminário.

Os estudantes tinham que se lavar lá fora no poço. Os primeiros a chegar dormiam no chão, sem colchão. Nós costuramos cortinas, pintamos uma tábua com tinta preta – esta servia como quadro negro. Arrumamos poltronas com tabuinhas ao lado. Elas serviam como mesa para o material de ensino e as lamparinas (quando faltava luz). Por fim, achamos a sala bem acolhedora.

Uma outra dificuldade foi o fato de que todos os alunos tinham que melhorar o nível escolar. Vários deles até então só haviam frequentado os primeiros quatro anos. Era impossível formar a estes como pastores depois de três anos. Todavia, nem todos achavam necessário frequentar paralelamente uma escola secular, mas depois todos estavam dispostos a fazê-lo. Mas, como eles tinham que estudar em classes diferentes, assim eles também estavam fora em horários diferentes. Para o nosso Seminário, isto significava que tínhamos que ensinar em grupos pequenos de manhã, de tarde e à noite. O corpo docente, portanto, estava envolvido o dia inteiro. Mas eram apenas duas pessoas: Pastor Otto Grellert, como diretor e secretário executivo da Convenção – ele ensinava Novo Testamento – e a professora da Alemanha para todas as outras matérias: Velho Testamento – Dogmática – Ética – História de Missões – Homilética – Catecismo – Psicologia. De noite, ela ainda tinha que escrever diversos temas por causa do idioma, pois os livros em alemão eram bastante complicados.

Ficamos um pouco aliviados quando um simpático alemão-americano (Professor Dr. Hugo Lück) passou conosco a metade do seu ano sabático. Infelizmente, ele teve que nos deixar. Não podemos negar: várias vezes a gente se sentia abandonado. Se os alunos não tivessem sido tão gratos, esforçados e simpáticos, eu não teria conseguido suportar tudo tão bem. Com muita alegria, nós íamos juntos para a Vila Glória, num bairro pobre diante das portas da cidade. Ali realizávamos cultos e escola dominical para crianças, e visitas em diversos barracos. Nos alegramos sobremaneira, quando mais tarde moradores da Vila Glória vinham aos domingos ao nosso templo.

Nas férias semestrais, os alunos tinham que voltar para casa e ajudar os pais na lavoura. Então a professora alemã viajava para visitá-los e tinha o privilégio de conhecer as famílias e as belas colônias. Pela primeira vez, ela viu cobras ao ar livre, observou crocodilos na lagoa e até dirigiu um carro de bois. Em todos os lugares, ela foi acolhida com muito carinho, e assim ela tem o Brasil numa viva recordação…

Em princípio, eu havia planejado não ficar apenas durante três anos no Brasil, mas cada vez ficava mais claro que um Instituto só poderia trabalhar objetivamente por um tempo mais longo se o ensino fosse dado em português. Futuros pastores precisam dominar muito bem o português e assim poderem se tornar compreensíveis e explícitos. Meus alunos aprenderam um alemão quase perfeito, mas eles teriam condições de expor bem o que aprenderam na língua da Pátria? Mas somente assim a gente consegue alcançar os que estão longe da igreja. Para mim, foi encontrado

um sucessor bem apropriado: Pastor Joel Lopes. Ele não falava o alemão, e assim o problema resolveu-se por si mesmo. Eu embarquei de novo num navio de carga, o qual passava em todos os portos do Brasil. Com isso, eu conheci toda a costa desse paradisíaco país. Depois de seis semanas, o navio ancorou no porto em Hamburgo. Eu desembarquei e assumi o trabalho de docente no Seminário Teológico Batista em Hamburgo. Eu aprendi muito no Brasil – muitas vezes também suspirei –, mas o que ficou firme na minha memória, são as muitas experiências que tive com o meu Senhor e os alegres encontros com convictos discípulos de Jesus.

¹ Texto escrito pela professora Dorothea Nowak em 1997 e traduzido pelo Pr. Alfredo Reinke.

FONTE: Livro “Faculdade Batista Pioneira – 50 anos de história”